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quarta-feira, 28 de setembro de 2011

EUA, paladino dos direitos humanos?

Os americanos, por natureza democráticos, amantes da justiça e da imprensa livre, não mentem. Que bom! Por isso, não seria justo reclamar que Bin Laden morreu, embora até o momento não tenha aparecido nenhum corpo (foi jogado ao mar) e o democrata Obama tenha proibido a publicação das fotos. Não coloquemos cabelo em sapo nem proclamemos conspirações fantasiosas. Admitamos que se livrar do corpo para evitar que sua sepultura se transformasse em local de peregrinação foi coerente. Afinal, os americanos sempre e zelosamente pensam um passo à frente em relação à paz mundial, sempre estão dispostos a mobilizar exércitos para libertar povos pelo mundo. Se Bin Laden foi o monstro que dizem que foi, e tudo indica que foi, já foi tarde. A morte de pessoas que levam inocentes à morte não deve ser lamentada. Mas... e sempre tem de ter um “mas”: é aceitável que um país com ideais tão democráticos agrida de forma tão abominável os direitos humanos, na medida em que reconhece ter obtido o paradeiro do terrorista mediante tortura?

Toda moeda tem duas faces, mas só uma nos foi apresentada, e, pelo poder bélico que os EUA detêm, a exibição da outra nem foi questionada. Ou o torturado não era integrante do gênero humano, daqueles que, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, tinha direito a um julgamento justo? Basta querer ler nas entrelinhas e ver que os EUA dizem ao mundo: “Em nome de nossas opiniões sobre justiça, nós podemos tudo, inclusive torturar. Vocês, outros, o resto do mundo não têm esse direito.”

Lamento sinceramente pelos 3.000 mortos das torres gêmeas. Eram inocentes. Morreram pelo ideal doentio de um monstro, mas localizado pela confissão sob tortura, como admitiu Obama.

Há menos de 150 anos, americanos mataram quase um milhão de americanos em sua guerra civil, sob a égide da mesma constituição a que ainda hoje cada um se subordina... ou deveria subordinar-se. Ambos os lados perseguiam um ideal. Uma constituição tão decantada e uma declaração universal de direitos tão idealista deveriam ser reescritas, ou se admita de vez que nem todos precisam obedecê-las, principalmente os mais fortes, formosos amantes da paz e da liberdade, guardiões do mundo, inimigos da tortura.

(Roberto Curt Dopheide é advogado. Texto publicado no Jornal de Santa Catarina, 9/5/11)


domingo, 4 de setembro de 2011

Sonhos de consumo: dá para viver sem eles

Diz uma velha história que o homem feliz não tinha camisa. Em plena sociedade de consumo, é impossível seguir o lema. Comprar faz parte do dia-a-dia, marca as relações sociais, é a base da economia. O problema é que o consumismo chegou a níveis insanos no mundo, aumentando a demanda por matéria-prima, a produção de lixo, a pressão sobre o meio ambiente. Resolver essa equação não é simples, mas precisamos encarar. Um relatório da organização WWF mostra que consumimos 30% acima da capacidade regenerativa do planeta. Se a tendência não mudar, em 2030 seriam necessárias duas Terras para suprir tal demanda. O relatório Planeta Vivo mostra ainda que tamanha pressão levou à perda de 30% da biodiversidade nos últimos 35 anos. Além do aumento populacional, a demanda gerada pelo ser humano dobrou por conta justamente do aumento do consumo individual.

Se compramos uma roupa nova, raramente consideramos que foi necessário cultivar algodão, processá-lo, fabricar a peça, empacotá-la, transportá-la. Se embarcamos em um avião, não pensamos que cada componente dele vem da natureza. É uma espécie de "ilusão de ótica", diz o professor da UFRJ José Augusto de Pádua, já que continuamos tão dependentes da natureza quanto nossos ancestrais.

Ao mesmo tempo em que não costumamos pensar nessas relações, o que consumimos diz muito sobre nós. "Consumir é comunicação", diz a cientista social Fátima Portilho, autora do livro Sustentabilidade ambiental, consumo e cidadania. "Através dos bens que uso eu também digo quem sou. Eles determinam o status na sociedade." E, para ela, não há nada de mau nisso: em qualquer cultura, bens materiais marcam fronteiras e dizem quem é quem na hierarquia social. Fátima considera um erro do movimento ambientalista tachar o que é "certo" e "errado".

O problema é que os recursos estão se exaurindo - e, o que é pior, por causa de uma minoria privilegiada. Uma pesquisa do Worldwatch Institute, "O Estado do Mundo 2004", mostrou que apenas um quarto dos habitantes do globo consomem acima de suas necessidades. Metade da população consome até a quantidade necessária para a sobrevivência, e metade disso, abaixo do que precisa.
De modo geral, o consumo está profundamente associado às carências e frustrações da vida contemporânea. "Muitas vezes ele supre uma fantasia: 'Se eu comprar tal roupa, serei mais bonita, poderosa, feliz'", diz a psicóloga Denise Ramos, da PUC-SP.

Se o consumo é um elemento tão fundamental no imaginário e na vida das pessoas, ele pode se tornar também um instrumento poderoso. Em uma pesquisa do Akatu, mais de 50% dos entrevistados disseram acreditar que o que compram define quem são. "Fica claro que, ao escolher empresas responsáveis, eles estão praticando um ato de cidadania", diz Helio Mattar. Sendo assim, se é impossível fugir do consumo, o jeito é abraçá-lo da melhor maneira. É o que Fátima Portilho chama de "politização do consumo". Segundo ela, de maneira crescente, o ato de escolher e usar produtos tem se tornado uma ação política ao lado de práticas tradicionais, como o voto. "É na esfera do consumo que as pessoas percebem que podem fazer alguma coisa. Com a internet, mais acesso à informação, o consumidor está cada vez mais ativo no mercado". (...)

Os especialistas são unânimes: não existe receita para ser um consumidor responsável. Há diversos sites, como o www.climaeconsumo.org.br, em que o visitante pode calcular sua pegada ecológica, o rastro de degradação ambiental deixado por seus hábitos. O site do Akatu traz o Teste do Consumidor Consciente, com uma série de perguntas para avaliar como o visitante pode tornar seus hábitos mais sustentáveis.

Em que você pode ajudar?

- Passe algumas das horas que gastaria nas compras visitando pessoas queridas, que você viu pouco no ano.

- Planeje os gastos, estipule um limite de despesas e não saia dele. Se comprar a crédito, atenção aos juros. Faça prestações que caibam no orçamento.

- Escolha presentes alternativos, reciclados, produzidos artesanalmente, de pouco impacto ambiental e feitos para durar.

- Dê presentes simbólicos: um texto escrito por você ou do qual goste; uma canção que marcou o ano, uma entrada para visitar uma exposição.

- Reflita antes de comprar: o presente é realmente do gosto do presenteado? É um gesto de real amizade ou apenas um "genérico"?

- Doe o que você não usa, proporcionando uma vida melhor a quem precisa.

- Diminua o uso de embalagens, preferindo as que possam ser reutilizadas.

- Recicle e dê cara nova a tudo o que for possível.

- Não compre produtos piratas ou contrabandeados, que contribuem com o crime organizado.

- Use luzes de baixo consumo.

- Compre o necessário: evite exagero de alimentos e bebidas. Se possível, escolha alimentos orgânicos e locais.

- Opte por comprar produtos de empresas social e ambientalmente mais responsáveis.

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